Projetos / Concurso / Centro Administrativo de Ribeirão Preto

 

O plano para o projeto do Centro Administrativo de Ribeirão Preto considerou três conceitos que, unidos, se configurariam em uma estratégia pertinente para resolver as questões colocadas pelo edital: modulação, intermediação do programa de necessidades através de circulações/conexões, e materialidade/sistema construtivo coerente com o contexto.

Viabilizar tal plano, não apenas sob o ponto de vista financeiro, mas técnico/construtivo, levou à adoção de algumas diretrizes.

Organizar o programa de necessidades, reconhecendo sinergias entre os diferentes agentes que constituem o Centro Administrativo, resultou na formação de grupos, ou blocos, que deveriam ser agenciados no terreno, levando em consideração as condicionantes. Entretanto, dada a escala do projeto, sem uma união entre essas condicionantes, grupos programáticos e técnica construtiva, o resultado poderia ser frágil: uma arquitetura desatenta à cultura local, história e contexto construtivo.

A arquitetura de Ribeirão Preto, seja no Ecletismo do período do Café, ou no Modernismo a partir da segunda metade do século XX, sempre esteve a par das discussões de vanguarda (ainda que mantendo certa discrição). Seria irresponsável não levar essa rica história em consideração ao se projetar um complexo que deve simbolizar o município.

O tamanho e complexidade do canteiro de obras da futura empreitada é motivo suficiente para a racionalização dos sistemas construtivos empregados. Tal racionalização não deve se dar apenas na escolha dos materiais e sistemas, mas também na estratégia de uso dos mesmos. A estrutura metálica, por exemplo: é errôneo partir do pressuposto que sua vantagem reside unicamente em vencer grandes vãos. Como se sabe, o concreto armado moldado in loco também permite a mesma proeza, como já ficou provado, e se prova sucessivamente, a mais de 60 anos no Brasil. As vantagens da estrutura metálica, pensadas como estratégia para o projeto do Centro Administrativo, foram duas: altura das vigas e cimbramento.

A flexibilidade que a planta livre proporciona, com estrutura e vedação agindo independentemente, pode ser viabilizada através da padronização de vãos da ordem de 10 metros, garantindo a mesma altura para todas as vigas (e por consequência tipológica, todos os pilares internos) e o mínimo de escoras para auxiliar o processo de construção. Tal sistema, composto por pilares e vigas de aço apoiando lajes pré-fabricadas, foi adotado para todos os blocos do Centro Administrativo, variando entre pórticos e vigas em balanço. O objetivo foi padronizar os elementos arquitetônicos: todas as vigas são de aço, perfil “I”, com altura h=70cm; todos os pilares são de aço, perfis quadrados (20cmX20cm), ou redondos (diâmetro de 20cm,

quando ficam soltos de alvenarias ou empenas); todas as lajes são pré-fabricadas, com espessura variando entre 17cm e 21cm.

As alvenarias de fechamento, também passaram por uma lógica de racionalização aliada à história da arquitetura da cidade e condicionantes locais. Ribeirão Preto é uma das cidades mais quentes do estado de São Paulo, com elevada temperatura e sensação térmica logo nas primeiras horas do dia. Por esse motivo, a adoção de fechamentos que respeitem uma modulação, e, ao mesmo tempo, se provem termicamente efetivos no conforto ambiental dos futuros edifícios, é essencial. Por isso foram adotados blocos estruturais cerâmicos, que por suas dimensões facilitam a racionalização da construção, por exemplo, através de tipologias de blocos tipo canaleta e blocos especiais para passagem das instalações hidráulicas e elétricas (eliminando a necessidade de quebrar alvenarias assentadas). Como os fechamentos dos edifícios não são estruturais, papel da estrutura metálica, a amarração dos blocos pode ser livre, por isso a decisão pela amarração em prumo, fator que facilita ainda mais a execução, alinhamento de prumadas de instalações e interface com fenestrações. Internamente, para garantir os andares corridos flexíveis, painéis de drywall dividem os poucos espaços fechados.

A adoção dos blocos cerâmicos nas empenas ao invés dos blocos de concreto, é reflexo do contexto local: a cerâmica se prova mais adequada ao clima e à cultura construtiva do município. Muitos são os exemplares arquitetônicos na cidade que utilizam a técnica do tijolo aparente, expondo o talento da mão de obra. Tal atitude, além de economizar com revestimentos, coloca o trabalho da mão de obra da construção civil em destaque, mostrando seu valor ao público. Da mesma forma, os blocos cerâmicos no Centro Administrativo devem ser preservados aparentes.

As cores escolhidas para o projeto priorizaram tons “terrosos”, como o vermelho carmim das serralherias. As aberturas adotam o esquema bipartido de iluminação e ventilação como estratégia de padronização das fenestrações: vidros fixos para iluminação e venezianas móveis opacas de alumínio para ventilação. A gradação e distribuição dos vidros fixos alternando as venezianas variam dependendo da posição da empena em relação à forte insolação de Ribeirão Preto. Para auxiliar ainda mais no controle dessa insolação direta, algumas empenas foram protegidas por pérgolas compostas por vigas metálicas em balanço, preenchidas com vigas de madeira espaçadas, configurando brises de generosas proporções.

A interface entre estrutura, fechamentos e terreno, se dá através de duas técnicas diferentes: pilotis, em locais em que o terreno original não é manipulado; e muros de arrimo com aterro, nos poucos locais em que um edifício toca o solo. Essa aproximação com o solo é delicada, já que o terreno escolhido para o projeto é uma área de recarga do Aquífero Guarani. Por isso a organização e distribuição do

programa no terreno, de topografia acidentada mas acessível, foi pensada de maneira a criar o mínimo de interfaces diretas, priorizando rampas, escadas, elevadores e passarelas. A pavimentação das áreas de conexão, com pisos intertravados e tábuas de madeira, visa a mínima impermeabilização do solo.

Em contraste com a rigidez da malha estrutural adotada, de vigas a cada 10 metros de distância, foram pensados intervalos entre os edifícios que provessem a possibilidade de conexão entre os mesmos através de passarelas, escadas, elevadores e rampas. Por conta dos níveis de pisos adotados, que variam a uma altura de 4,20 metros, ficou decidido que todas as coberturas dos edifícios poderiam ser acessadas e utilizadas, seja através de solários e floreiras, ou através de terraços jardim. Além da vantagem térmica, o revestimento das lajes de cobertura com jardim ofereceria visuais interessantes às pessoas que trabalhariam, visitariam e se deslocariam todos os dias no complexo. Levando-se em conta que o sítio possuí um bosque de eucaliptos preservado, interface entre o local e a cidade, o desfrute dessas visuais traria benefícios às pessoas, e contribuiria para a construção de uma relação entre indivíduo e espaço.

Por conta da configuração do terreno, em formato de “L”, e do já citado bosque, adotou-se uma organização do projeto que visa preservar a paisagem existente ao mesmo tempo que segue diretrizes do plano viário. Dessa forma, os acessos a visitantes e funcionários acontecem através de uma via de transito local e via coletora, deixando à Avenida Cavalheiro Paschoal Innecchi apenas o transito casual de serviços e emergências. Os edifícios das secretarias, organizados em blocos por meio de afinidades, foram organizados com espaçamentos alternados ao longo da via local paralela à avenida. Demais programas como recepção, auditórios e restaurantes, foram posicionados na esquina das vias coletora e local, distantes da avenida. O intuito foi que a área do bosque continue justamente a ser isso: um bosque, com a diferença de que com o Centro Administrativo instalado na borda, o bosque é acessível, organizado e aberto à população da cidade. Além da arborização preservada, foi proposto novo paisagismo na área restante, respeitando o espaço dos eucaliptos e criando novas possibilidades de sombra. Em pontos específicos de pouca arborização, foram propostos espelhos d’água que auxiliam no conforto térmico.

Ligando os blocos das secretarias aos blocos de recepção, auditórios e serviços, foi proposta uma passarela elevada. Entretanto, para que a passarela não resultasse em um caminho linear, a geometria proposta visa criar pequenas praças próximas a cada bloco, resultando em uma relação visual rica com o entorno, tanto horizontalmente quanto verticalmente, uma vez que a passarela se abre e acopla em cada edifício em diferentes níveis topográficos, sem nunca se desviar da mesma cota. Para que a geometria fosse possível, e para contrastar com a racionalização do sistema

construtivo adotado nos edifícios, a passarela foi pensada como uma grande escultura em concreto armado aparente, cujas tábuas de fôrmas de madeira impressas na superfície, usadas na construção, seriam reaproveitadas como pavimentação no restante do complexo.

O Centro Administrativo é um espaço que comporta um programa de necessidades extenso, cujas relações e conexões são um rico ambiente de convivência e trabalho, símbolo da complexa relação que Ribeirão Preto possuí com seus espaços públicos e privados, separados, por vezes, por altos muros. A relação do projeto com a cidade, quase despercebida na avenida pela preservação e requalificação do bosque, se daria também por um muro, mas não fechado, cego. O muro de tijolos aparentes é vazado, configuração possível através da amarração alternada e ritmo que a topografia do local impõe. Ao invés de um muro, Ribeirão Preto ganha milhares de janelas, por onde pode-se observar uma construção: um espaço que pelo convívio se torna um lugar.

Ficha Técnica

Concurso
Ribeirão Preto - SP

PROJETO
2019
ETAPA
Estudo Preliminar

ARQUITETURA
Fernando Gobbo, Larissa França e Gabriela Secaf

Colaborador: Lorena Finassi